Marcos Abreu Torres e Elisa Romano Dezolt
MARCOS ABREU TORRES é Advogado, Pós-Graduado em Direito Ambiental e Gestão Estratégica da Sustentabilidade pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e Consultor Jurídico da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
ELISA ROMANO DEZOLT é Bióloga, Pós-Graduada em Parcerias Intersetoriais pela Universidade de Cambridge (University of Cambridge Programme for Industry) e Analista de Políticas e Indústria da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
MARCOS ABREU TORRES é Advogado, Pós-Graduado em Direito Ambiental e Gestão Estratégica da Sustentabilidade pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) e Consultor Jurídico da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
ELISA ROMANO DEZOLT é Bióloga, Pós-Graduada em Parcerias Intersetoriais pela Universidade de Cambridge (University of Cambridge Programme for Industry) e Analista de Políticas e Indústria da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
31/1/2013
O licenciamento ambiental é o procedimento administrativo
destinado a licenciar atividades ou empreendimentos utilizadores de
recursos ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes,
sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, conforme conceitua a
Lei Complementar nº 140/11 (analisada na edição n° 123 desta revista,
em junho de 2012). Em palavras simples, é o procedimento pelo qual o
órgão ambiental competente analisa um pedido de implantação de um
empreendimento ou atividade à luz das disposições legais e
regulamentares de proteção ao meio ambiente.
Trata-se do mais importante instrumento de controle ambiental
existente no País: quanto melhor elaborado for o processo de
licenciamento ambiental, menor será a necessidade de fiscalizar o
empreendimento. Ademais, o licenciamento ambiental caracteriza-se pela
tutela preventiva do meio ambiente, enquanto que a fiscalização,
normalmente, exerce função repressiva, quando o dano já foi causado.
Até hoje o Brasil não possui uma lei federal disciplinando, de modo
amplo, o processo de licenciamento ambiental. O que existe, no âmbito
federal, são fragmentos de uma disciplina legal e diversas normas
infralegais de duvidosa legalidade.
Com efeito, o art. 9º, inciso IV, da Lei nº 6.938/81 classifica o
licenciamento ambiental como instrumento da Política Nacional do Meio
Ambiente, sendo exigido para a construção, instalação, ampliação e
funcionamento de empreendimentos e atividades utilizadores de recursos
ambientais, efetiva ou potencialmente poluidores ou capazes, sob
qualquer forma, de causar degradação ambiental dependerão de prévio
licenciamento ambiental (art. 10).
Diante de uma omissão legislativa que resiste até hoje, o Conselho
Nacional do Meio Ambiente – CONAMA aprovou, em 1997, a Resolução n°
237, dispondo sobre procedimentos e critérios do processo de
licenciamento ambiental.
A Resolução definiu uma lista de atividades e empreendimentos
sujeitos ao licenciamento ambiental que vão desde a fabricação de
móveis em madeira à construção de hidrelétricas. Apesar de bastante
abrangente, trata-se de uma lista exemplificativa, podendo ser ampliada
a critério do órgão licenciador. Tal discricionariedade encontra-se
prevista no § 2º do art. 2º da Resolução.
O licenciamento ambiental é um procedimento formado por diversas
fases. Uma das primeiras é a definição dos documentos, projetos e
estudos ambientais necessários, de acordo com as características do
empreendimento ou atividade, como o porte, a natureza e o potencial
poluidor. Na edição passada desta seção, vimos que o órgão licenciador
poderá exigir desde um estudo mais simples, como o Relatório Ambiental
Simplificado – RAS, até o mais complexo deles, o Estudo de Impacto
Ambiental e respectivo Relatório – EIA/RIMA.
Aprovado o respectivo estudo, poderá, então, ser emitida a primeira
das licenças ambientais: a Licença Prévia (LP), concedida na fase
preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade, aprovando
sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental e
estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos
nas próximas fases de sua implementação.
Em seguida, o empreendimento ou a atividade estará apto a obter a
Licença de Instalação (LI), autorizando, como o próprio nome já diz, a
instalação do empreendimento ou atividade de acordo com as
especificações constantes dos planos, programas e projetos aprovados,
incluindo as medidas de controle ambiental e demais condicionantes, da
qual constituem motivo determinante.
Por fim, atendidos os parâmetros aprovados e cumpridas as
condicionantes estabelecidas na LP e na LI, o órgão licenciador emitirá
a Licença de Operação (LO), autorizando a operação da atividade ou
empreendimento, com as medidas de controle ambiental e condicionantes
determinadas para a operação.
A Resolução CONAMA permite a definição de procedimentos específicos
para as licenças ambientais, observadas a natureza, características e
peculiaridades da atividade ou empreendimento. Em alguns Estados, por
exemplo, é comum a previsão do Licenciamento Simplificado para
empreendimentos e atividades potencialmente causadores de baixo impacto
ambiental, abrangendo todas as fases da LP, LI e LO, de forma sucinta.
Em 2011, o Ministério do Meio Ambiente divulgou uma série de portarias
definindo critérios específicos para o licenciamento ambiental de
rodovias federais, sistemas de transmissão de energia elétrica e
exploração e produção de petróleo e gás natural no ambiente marinho e
em zona de transição terra-mar.
Em geral, o licenciamento ambiental é um procedimento complexo, do
qual participam outros atores além do órgão licenciador. Recentemente,
foi editada a Portaria Interministerial n° 419/11, assinada pelos
Ministros do Meio Ambiente, da Justiça, da Cultura e da Saúde,
regulamentando a atuação da Fundação Nacional do Índio – FUNAI, da
Fundação Cultural Palmares – FCP, do Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional – IPHAN e do Ministério da Saúde,
quando incumbidos da elaboração de parecer em processo de
licenciamento ambiental a cargo do IBAMA. Vale salientar, entretanto,
que essas manifestações paralelas não vinculam a decisão do órgão
licenciador, que poderá acatar ou rejeitar o parecer, bem como
solicitar complementações.
Também é possível estabelecer prazos de validade para cada tipo de
licença, devendo ser para a LP, no mínimo, igual ao estabelecido pelo
cronograma de elaboração dos planos, programas e projetos relativos ao
empreendimento ou atividade, mas não podendo ser superior a cinco anos;
a LI valerá por, no mínimo, o estabelecido pelo cronograma de
instalação do empreendimento ou atividade, desde que não supere os seis
anos; e, no caso da LO, o prazo de validade deverá considerar os planos
de controle ambiental, sendo de no mínimo quatro anos e no máximo 10
anos. A renovação da LO deverá ser requerida pelo empreendedor com
antecedência mínima de 120 dias da expiração de seu prazo de validade,
ficando este automaticamente prorrogado até a manifestação definitiva
do órgão licenciador. Em geral, trata-se de um processo mais simples,
embora não raro seja solicitada a apresentação de algum documento,
projeto ou estudo ambiental complementar.
O órgão licenciador poderá, ainda, estabelecer prazos de análise
diferenciados para cada modalidade de licença em função das
peculiaridades da atividade ou empreendimento, bem como para a
formulação de exigências complementares, desde que observado o prazo
máximo de seis meses a contar do requerimento, ressalvados os casos em
que houver EIA/RIMA, quando o prazo será de até 12 meses.
Muito se discute acerca da natureza jurídica da licença ambiental,
tendo, de um lado, doutrinadores entendendo que se trata de um ato
administrativo discricionário e precário (devendo-se, chamar, portanto,
de autorização ambiental, e não licença), e de outro lado a corrente
que defende a vinculatividade da licença ambiental, argumentando que,
se preenchidos os requisitos legalmente exigidos para a sua concessão, o
interessado tem o direito de obter a respectiva licença.
Édis Milaré faz um comentário que esclarece a aparente contradição entre o termo licença,
que, no Direito Administrativo clássico, denota um ato administrativo
vinculado e definitivo, e a eventual discricionariedade que os órgãos
ambientais dispõem para a concessão da LP e da LI, bem como para exigir
a renovação da LO:
“Na realidade, não há atos inteiramente vinculados ou inteiramente discricionários, mas uma situação de preponderância, de maior ou menor liberdade deliberativa do seu agente. (…) No caso do licenciamento ambiental, sem negar à Administração a faculdade de juízos de valor sobre a compatibilidade do empreendimento ou atividade a planos e programas do governo, sobre suas vantagens e desvantagens para o meio considerado, o matiz que sobressai é o da subordinação da manifestação administrativa ao requerimento do interessado, uma vez atendidos, é claro, os pressupostos legais relacionados à defesa do meio ambiente e ao cumprimento da função social da propriedade.”1
Com relação ao caráter de estabilidade das licenças ambientais,
cumpre observar que este não se confunde com a sua definitividade. A
licença ambiental goza do caráter de estabilidade juris tantum,
não podendo ser suspensa nem cancelada por motivos de conveniência ou
oportunidade do Poder Público. Eventual suspensão somente poderá
ocorrer nas hipóteses taxativas de violação ou inadequação de quaisquer
condicionantes ou normas legais, omissão ou falsa descrição de
informações relevantes que subsidiaram a expedição da licença ou
superveniência de graves riscos ambientais e de saúde.
Com a edição da Lei Complementar nº 140/11, que definiu as
competências dos entes federativos para o exercício do poder de polícia
ambiental, incluindo o licenciamento ambiental, a maior pendência
atual do assunto é a aprovação de uma lei federal prevendo regras e
critérios gerais para o processo de licenciamento ambiental, aplicáveis
uniformemente em todo o território nacional. A ausência dessa lei
permite que cada Estado estabeleça regras e critérios próprios, sem que
haja um mínimo de harmonia quanto às exigências. Isso acaba por gerar
insegurança jurídica e incerteza, afastando investimentos e
dificultando a realização de obras necessárias ao País. A omissão
legislativa do Congresso Nacional também é a causa da ausência na
padronização dos procedimentos do licenciamento ambiental, ampliando a
discricionariedade dos analistas dos órgãos licenciadores, o que também
gera insegurança na análise dos estudos e, consequentemente, um número
excessivo de condicionantes vinculadasà emissão das licenças.
Portanto, o maior desafio, hoje, do licenciamento ambiental traduz-se
na edição de uma lei federal, com regras claras e objetivas, que
confiram maior previsibilidade e celeridade aos processos de
licenciamento ambiental, bem como uma melhor estruturação, capacitação
de pessoal e aparelhamento técnico dos órgãos licenciadores.
NOTAS
1 MILARÉ, Édis. Direito do Ambiente. 2. ed. São Paulo: RT, 2001, p. 363.
Nenhum comentário:
Postar um comentário