segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Princípios Fundamentais do Direito Processual Penal – Parte 09

PRINCÍPIOS RELATIVOS AO JÚRI (Art. 5º, XXXVIII, da CF/88)

Em relação aos princípios relativos ao júri, preleciona Guilherme de Souza Nucci em sua obra Princípios Constitucionais Penais e Processuais Penais que:
“O Tribunal do Júri é instituição reconhecida pela Constituição Federal como direito individual à participação do povo nas decisões judiciais, assim como representa a garantia ao devido processo legal para apurar crimes dolosos contra a vida, julgando seus autores.
Sua consolidação e afirmação dão-se em virtude de princípios regentes, consubstanciados na soberania de seus veredictos, no sigilo das votações e na preservação de competência mínima constitucionalmente estabelecida para apreciar os crimes dolosos contra a vida.
Ausente a soberania de suas decisões, tornar-se-ia órgão popular de consulta e parecer, não vinculando o Judiciário togado, que, com o passar do tempo, ignoraria a vontade do povo, privilegiando o culto ao saber jurídico.
O desprestígio ao sigilo das votações constituiria fonte de constrangimento aos jurados, leigos que são, desprovidos das garantias da magistratura togada, provocando intranquilidade nos tensos momentos de decisão.
A inexistência de competência mínima, forçosamente fixada na Constituição Federal, poderia levar a instituição ao ocaso, conforme mutações na legislação orfinária, sem que se pudesse impor a sua relevância”.
 Ou seja, dentro da instituição do Júri existem 4 princípios garantidos pela Constituição Federal, sendo eles a) o princípio da plenitude de defesa; b) sigilo das votações; c) soberania dos veredictos; d) competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, consumados ou tentados.

PRINCÍPIO DA PLENITUDE DE DEFESA

Conforme preleciona Nucci em sua obra Princípios Constitucionais Penais e Processuais Penais:
 “A plenitude de defesa, como princípio regente do Tribunal do Júri (art. 5º, XXXVIII, a, da CF), tem significado e alcance diverso da ampla defesa. Várias são as razões a expressar a diferença existente entre ambas as garantias: a) o pleno indica algo completo e perfeito, enquanto o amplo aponta para vasto e extenso. A plenitude clama por uma robusta e integral forma de defesa, enquanto a ampla pede uma vasta e abundante atuação, ainda que não seja cabal e absoluta; b) a maior proteção que se deve conferir ao réu, no Tribunal do Júri, dá-se justamente pela natureza da corte popular, que decide em votação sigilosa, sem qualquer fundamentação o destino do acusado. Exige-se portanto, uma impecável atuação defensiva, sob pena de se configurar um cerceamento pela fragilidade do próprio defensor; c) os jurados são pessoas do povo, sem as garantias dos juízes togados, podendo-se influenciar por atuações impecáveis das partes, durante suas manifestações. Eis por que o defensor, no júri, precisa ser tarimbado, talentoso e combativo, além de bem preparado; d) no plenário do júri vigora a oralidade, a imediatidade e a identidade física do juiz, de modo que, a atuação da defesa necessita ser perfeita, visto inexistir outra chance; e) a soberania dos veredictos é outra garantia da instituição do júri, implicando dizer que não pode ser alterada, no mérito, por outra corte togada. Sobreleva, então, a importância da defesa, pois a decisão final estará a cargo dos jurados; f) nas varas e cortes togadas, o magistrado é bem preparado e conhecedor das leis e da jurisprudência, podendo suprir eventual falha da defesa, aplicando a melhor solução ao caso, mesmo que não tenha sido o pedido formulado pelo advogado. No júri, os jurados são leigos e dificilmente poderão suprir eventuais deficiências da atuação defensiva”.
Por fim, a plenitude de defesa é um princípio fundamental do tribunal popular que está implicitamente no princípio do devido processo penal que deverá ser sempre garantido, em qualquer circunstância, não podendo permitir o Poder Judiciário, mesmo que o juiz togado seja imparcial, que haja condenação de um indivíduo inocente e mais, que a legislação processual ordinária, embora com diversos projetos de lei em andamento, preveja assim como mantenha os devidos instrumentos processuais para que não se inutilize o importantíssimo mandamento constitucional.

PRINCÍPIO DO SIGILO DAS VOTAÇÕES

O sigilo opõe-se, naturalmente, à publicidade. No entanto, sabe-se que as regras no trâmite processual admitem exceções. Ambas de nível constitucional e igualmente previstas em lei, além de consideravelmente úteis. Em sede de Tribunal de Júri o sigilo é elemento assegurador da imparcialidade, da independência, da liberdade de convicção e de opinião dos jurados.

Nucci em sua obra Princípios Constitucionais Penais e Processuais Penais nos traz que:
“A publicidade dos atos processuais e das sessões de julgamento deve-se, primordialmente, à garantia de visibilidade da imparcialidade do magistrado, assegurando-se o controle e a fiscalização do sistema judiciário por qualquer do povo. Porém, há casos em que o sigilo merece prevalência, como ocorre para a preservação da intimidade de alguém ou para abonar o interesse social e públicos (art. 5º, LX; art. 93, IX, ambos da CF/88).
No caso do Tribunal do Júri, busca-se resguardar a serenidade dos jurados, leigos que são, no momento de proferir o veredicto, em sala especial, longe das vistas do público. Não se trata de ato secreto, mas apenas de publicidade restrita, envolvendo o juiz togado, o órgão acusatório, o defensor, os funcionários da justiça e, por óbvio, os sete jurados componentes do Conselho de Sentença.
O resguardo da votação permite maior desenvoltura do jurado para solicitar esclarecimentos ao magistrado togado, consultar os autos e acompanhar o desenvolvimento das decisões, na solução de cada quesito, com tranquilidade, sem a pressão do público presente, nem tampouco do réu”.
Sobre este princípio em análise, discorre Julio Fabbrini Mirabete:
A própria natureza do júri impõe proteção aos jurados e tal proteção se materializa por meio do sigilo indispensável em suas votações e pela tranqüilidade do julgador popular, que seria afetada ao proceder a votação sob vistas do público. Aliás, o art. 93, IX, não pode se referir ao julgamento do júri, mesmo porque este, as decisões não podem ser fundamentadas (Mirabete, 2000, pág. 1032).

PRINCÍPIO DA SOBERANIA DOS VEREDICTOS

Conforme preleciona Nucci em sua obra Princípios Constitucionais Penais e Processuais Penais:
“A soberania dos veredictos é a alma do Tribunal Popular, assegurando-lhe o efetivo poder jurisdicional e não somente a prolação de um parecer, passível de rejeição por qualquer magistrado togado. Ser soberano significa atingir a supremacia, o mais alto grau de uma escala, o poder absoluto, acima do qual inexiste outro. Traduzindo-se esse valor para o contexto do veredicto popular, quer-se assegurar seja esta a última voz a decidir o caso, quando apresentado a julgamento no Tribunal do Júri (…) Respeitar a soberania dos veredictos significa abdicar da parcela de poder jurisdicional, concernente ao magistrado togado, para, simplesmente, fiscalizar e buscar corrigir excessos e abusos, mas sem invadir o âmago da decisão, crendo-a justa ou injusta (…) O parâmetro correto para a reavaliação do Tribunal togado em relação à decisão do júri é o conjunto probatório: se há duas versões válidas, dependentes apenas da interpretação, para levar à condenação ou à absolvição, escolhida uma das linhas pelo Conselho de Sentença, há de se respeitar sua soberania”. Grifo nosso
 Como bem observa Julio Fabbrini Mirabete:
A soberania dos veredictos dos jurados, afirmada pela Carta Política, não exclui a recorribilidade de suas decisões, sendo assegurada com a devolução dos autos ao Tribunal do Júri para que profira novo julgamento, se cassada a decisão recorrida pelo princípio do duplo grau de jurisdição. Também não fere o referido princípio a possibilidade da revisão criminal do julgado do Júri,[lxxxi] a comutação de penas etc. Ainda que se altere a decisão sobre o mérito da causa, é admissível que se faça em favor do condenado, mesmo porque a soberania dos veredictos é uma “garantia constitucional individual” e a reforma ou alteração da decisão em benefício do condenado não lhe lesa qualquer direito, ao contrário beneficia (Mirabete, 2006, pág. 496).
Hermínio Alberto Marques Porto destaca que à soberania do Júri é mantida não apenas durante o procedimento do Tribunal do Júri, pois seus efeitos permanecem após o julgamento, se não vejamos:
O entendimento do conceito de soberania reaparece com seus efeitos após o julgamento pelo Tribunal do Júri, por ocasião do exame de apelação buscando a rescisão, pelo mérito, do decidido pelos jurados; ao Tribunal do Júri cabe proferir decisão, então não manifestamente contrária á prova, que encontre amparo em contingente menor de provas em conflito; e decisões com tal amparo, que não prevaleceriam, em regra, quando proferidas por Juiz singular, são mantidas porque excepcional a marginalização das decisões dos jurados, o entendimento do conceito de soberania dá atenção a seus limites, agora, então sem caráter ampliativo e indevido (Porto, 1989, pág. 33).
Por fim, Julio Fabbrini Mirabete, ainda acrescenta:
A final, o art. 593, III, d, prevê a apelação para a decisão do Tribunal do Júri quando a decisão dos jurados for manifestamente contrária à prova dos autos. Trata-se de hipótese em que se fere justamente o mérito da causa, em que o error in judicando é reconhecido somente quando a decisão é arbitrária, pois se dissocia integralmente da prova dos autos, determinando-se novo julgamento. Não se viola, assim, a regra constitucional da soberania dos veredictos. Não é qualquer dissonância entre o veredicto e os elementos de convicção colhidos na instrução que autorizam a cassação do julgamento. Unicamente, a decisão dos jurados que nenhum apoio encontra na prova dos autos é que pode ser invalidada. É lícito ao Júri, portanto, optar por uma das versões verossímeis dos autos, ainda que não seja eventualmente essa a melhor decisão (Mirabete, 2000, pág. 1.252).

PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA COMPETÊNCIA PARA O JULGAMENTO DOS CRIMES DOLOSOS CONTRA A VIDA

A fixação da competência do Tribunal do Júri é efetivada em norma constitucional, qual possuí a finalidade de preservar a instituição das investidas contrárias a sua existência, passíveis de constar em leis ordinárias.
Nucci em sua obra Princípios Constitucionais Penais e Processuais Penais nos brinda dizendo que:
“A meta da reserva de competência adquire o contorno de enaltecimento da instituição popular, conferindo-lhe importância no cenário do Judiciário, visto tratar de julgamentos de delitos, cujo tutela concentra-se na vida humana, o mais relevante dos bens jurídicos.
(…) Cuida-se de eleição política, cujo escolha concentrou-se em infrações penais graves e presentes no cenário nacional, permitindo a visibilidade da instituição em todas as Comarcas brasileiras.
Ademais, a competência eleita é mínima e não taxativa ou exclusiva. O júri será organizado nos termos da lei ordinária assegurada (tornando seguro) a competência para os delitos dolosos contra a vida. Outros crimes podem ser envolvidos pelo Tribunal Popular, desde que haja alteração legislativa, incluindo novas figuras típicas na sua alçada”.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALEXY, Robert. Teoria de los Derechos Fundamentales. Madri: Centro de Estúdios Políticos y Constitucionales, 2001.
AMARAL, Claudio do Prado. Princípios Penais: da Legalidade à Culpabilidade. São Paulo: IBCRIM, 2003.
BATISTA, Nilo. Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro, Rio de Janeiro: Revam, 11ª ed., 2007.
DORÓ, Tereza Nascimento Rocha Dóro. Princípios no Processo Penal Brasileiro, Campinas – SP: Copola, 1999.
DO VALE, Ionilton Pereira. Princípios Constitucionais do Processo Penal – na visão do Supremo Tribunal Federal. São Paulo: Método, 2009.
FAVORETTO, Affonso Celso. Princípios Constitucionais Penais. 1ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
GOMES, Luiz Flávio. Estudos de direito penal e processo penal. São Paulo: RT,1999.
JAKOBS, Günther. Fundamentos do direito penal, trad. de André Luís Callegari, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003.
JARDIM, Afrânio Silva. Direito Processual Penal. Rio de Janeiro: Forense, 2003
MARQUES PORTO, Hermínio Alberto. Júri: procedimento e aspectos do julgamento – questionários. 5º ed. rev. atual. amp. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1989.
MIRABETE, Julio Fabrini. Processo Penal. São Paulo: Atlas, 18ª ed., 2006.
_____________________, Código Processo Penal. 7º ed. rev. atual. amp. São Paulo: Editora Atlas.2000.
NUCCI, Guilherme de Souza. Princípios Constitucionais Penais e Processuais Penais. 2ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.
PEREIRA E SILVA, Igor Luis. Princípios Penais. 1ª Ed. Editora Juspodivm, 2012.
ROXIN, Claus, Derecho penal – Parte General, trad. Luzón Peña e outros, Madri, Civitas, 1997.
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. 25. ed. São Paulo: Saraiva, 2003. v. 1, p. 71
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. v. 3.

REFERÊNCIAS DIVERSAS

Apostila do curso intensivo com o Prof. Rogério Sanchez Cunha para OAB da LFG.
Curso de Direito Processual Penal com o Prof. Pedro Ivo (www.pontodosconcursos.com.br)
Artigo de Vladimir Aras sobre Princípios do Processo Penal (http://jus.com.br/revista/texto/2416/principios-do-processo-penal)
Artigo de Eliana Descovi Pachego sobre Princípios norteadores do Direito Processual Penal (http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=3913&revista_caderno=22)
Artigo de Viviani Gianine Nikitenko. Aspectos do princípio da presunção de inocência e do princípio in dubio pro reo. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1079, 15 jun. 2006 . Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/8513>. Acesso em: 18 jul. 2013.

Nenhum comentário:

Postar um comentário